Um pão de batata em vinte minutos

By 20 de abril de 2017Reflexão
Pão de Batata

Tinha acabado de chegar ao hotel na pequena Águas de São Pedro, SP, depois de mais um dia inteiro em expedição – o Projeto Águas do Amanhã – pelo Rio Piracicaba. Estávamos eu e meu amigo Dan Robson fazendo um monitoramento da qualidade da água por todo o rio.

Deixei a mochila e equipamentos no quarto e fui ao centro comercial da pequena cidade tomar um café ou algo do tipo. No caminho, encontrei um sebo onde comprei pela segunda vez o livro “Bagagem”, da Adélia Prado, pois precisava da companhia de uma boa poesia para me transcender depois de um dia de muito trabalho.

Fui a uma cafeteria e sentei em uma daquelas mesas de calçada, ao lado de uma praça onde algumas pessoas de idade mais avançada, aparentemente aposentados, jogavam dominó. Ali olhando o cardápio acabei pedindo um suco e um pão de batata e a situação para minha reflexão começou quando a dona da cafeteria me disse que o pão iria demorar uns vinte minutos, já que era assado na hora. “Como assim?”, eu perguntei. “Você está me dizendo que vou precisar esperar vinte minutos para comer um pão de batata?”. A moça, muito gentil, me explicou que sim e pediu minha compreensão, pois seria feito na hora e especialmente para mim.

Eu não conseguiria esperar tanto tempo por um simples pão de batata… talvez meu estômago sim, mas eu não. Levantei, saí do local e estava disposto a procurar outro lugar mas, não caminhei nem dez metros e me questionei o porquê eu não poderia esperar os vinte minutos pelo pão, sendo que não tinha exatamente nada para fazer. Foi então que eu percebi que, naquela mesa na pequena Águas de São Pedro, estava sentado o meu “eu demasiadamente urbano”.

O Dr. Stephen Bertman, professor emérito na Universidade do Canadá, em Windsor, cunhou a cultura de nosso tempo de “cultura agorista” para representar nosso estilo de vida nos grandes centros urbanos. Estilo esse que vivemos sem tempo para nada, nem mesmo tempo para comer slow foods, apenas nos alimentamos para manter as baterias carregadas e continuar correndo.

De fato, eu já estava disposto a mudar esse modo de viver ansiosamente mas, quando menos percebi, estava apressado mesmo em condições onde não havia necessidade para tal. Não sei dizer algo psicologicamente a respeito, mas o que percebo é que estava ligado no automático aquele dia e ainda tantas vezes, até hoje, me sinto como que “programado de fábrica” para viver assim, apressadamente.

Confesso que ainda não estou livre, interiormente, da parte da minha vida que representa isso que chamo de meu “eu demasiadamente urbano”. Talvez eu nunca esteja verdadeiramente livre, mas não quero me render à “cultura agorista” cunhada por Bertman.

Quero continuar inconformado comigo mesmo enquanto eu não for capaz de enxergar a beleza de ficar sentado na calçada de uma praça do interior por apenas vinte minutos, sem absolutamente nada para fazer durante ou depois. Quero lutar contra a minha forma de viver apressadamente e contra esse meu eu demasiadamente urbano.

Voltei para a cafeteria e humildemente disse à moça para, por favor, colocar o pão de batata no forno. “Vou aguardar os 20 minutos, obrigado”.

Alan

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